Por Guilherme Bryan guilherme.bryan@folhauniversal.com.br Estreou, na última sexta-feira (26), nos cinemas brasileiros, o filme “Jean Charles”, estrelado por Selton Mello e Vanessa Giácomo, e que gira em torno da história do brasileiro Jean Charles de Menezes que, em 22 de julho de 2005, quando tinha 27 anos, levou sete tiros na cabeça disparados por membros da Scotland Yard, no metrô de Londres, na Inglaterra, após ser confundido com terrorista que, no dia anterior, havia participado de atentado na capital inglesa. Antes de vir ao Brasil para o lançamento do filme, o diretor brasileiro Henrique Goldman, de 47 anos, conta, de Londres, porque resolveu filmar essa história recente que chocou o País e o que pensa a respeito do tratamento dado brasileiros que vivem na Europa, como ele próprio. 1 – Por que você resolveu filmar uma história tão marcante como a de Jean Charles? Procuro sempre histórias que sejam relevantes para mim e, ao mesmo tempo, relevantes para um grande público. No nível pessoal, minha identificação com o Jean Charles é enorme, pois sou brasileiro, vivo em Londres e o morto naquele fatídico dia de verão em 2005 poderia ter sido eu. Já na esfera coletiva, essa história despertou enorme interesse no mundo inteiro, porque envolve grandes temas da atualidade como fundamentalismo religioso, imigração e racismo. Se Jean Charles fosse loiro e de olhos azuis, ele não teria sido morto. 2 – O fato de essa história estar muito fresca na memória das pessoas e de não haver um desfecho para o caso dificultou a realização do filme? Nosso filme não é apenas a respeito da morte de Jean Charles. É uma celebração da vida dele e da vida dos brasileiros no exterior. Para nós, as questões legais e jurídicas são menos importantes do que o que aconteceu pessoalmente com o Jean e sua família. Ao mesmo tempo, não queríamos retratá-lo como um santo. Ele era um sonhador, idealista, mas que também fazia pequenos trambiques, porque, como tantos estrangeiros, ele precisava sobreviver. Então, a escolha do Selton Mello para interpretá-lo foi óbvia. Ninguém como o ele pode ser um pouco pilantra, mas infinitamente simpático e charmoso. O desempenho dele é excelente. 3 – Como foi a relação com a família de Jean Charles durante o projeto? Fizemos o filme com a colaboração da família. Lemos o roteiro para os familiares várias vezes na fase de elaboração e eles deram muitos palpites e fizeram exigências, como lhes é de direito, mas prefiro não entrar em detalhes específicos. Acho melhor que seja dito pelos próprios familiares. 4 – Vocês tomaram algum partido com relação ao desempenho dos policiais britânicos envolvidos no caso? É quase desnecessário tomar partido, pois a história fala por si só. A polícia não só foi incompetente e negligente ao matar Jean Charles de forma tão absurda, mas, pior ainda, agiu de forma totalmente desonesta ao tentar se redimir culpando o Jean pela própria morte (O caso continua sem desfecho e ninguém ainda foi punido. Em dezembro do ano passado, jurados britânicos consideraram o caso inconcluso). 5 – Por que a rede estatal britânica “BBC” resolveu deixar a produção do filme? Não conheço a razão oficial pela qual decidiram abandonar o projeto, mas nossos interesses eram divergentes. Eles queriam um filme sobre a polícia britânica e eu um filme sobre o Jean Charles, seus primos e os brasileiros que vivem em Londres. 6 – De que modo as dificuldades de um imigrante brasileiro em Londres aparecem no longa-metragem? Apesar de ser quase inteiramente filmado em Londres, o filme se passa num universo absolutamente brasileiro e é sobre a diáspora brasileira, provocada principalmente pela crise econômica e pelo baixo custo das passagens aéreas. 7 – A experiência que você tem de morar há 27 anos fora do Brasil foi utilizada na produção do filme? Eu estou retratando um mundo e uma condição que conheço muito bem. Ou seja, conto uma história que é também minha, de frio, solidão e saudades. Londres é uma cidade muito dura. Aqui não temos tempo para o outro. É cada um por si e Deus por todos. Inicialmente, eu tive a sorte de receber um visto de profissional e, depois, me casei com uma inglesa. Hoje, tenho dupla cidadania. Mas já vi muita gente se dar mal e não gosto da mentalidade xenófoba que existe aqui. 8 – Você vivenciou esse pânico que se instalou em vários países da Europa com relação ao terrorismo? Sim. A cidade de Londres inteira viveu em pé de guerra durante algumas semanas. Esses ataques são muito tristes, mas os britânicos não podem perder a oportunidade de fazer autocrítica e entender por que isso aconteceu e qual é o seu papel no mundo. 9 – O filme inteiro é baseado em fatos que realmente aconteceram? No seu espírito, o filme é muito fiel à vida do Jean Charles, dos primos dele e de tudo que estava acontecendo em Londres, em 2005. Mas resolvemos extrapolar a história para retratar também a vida dos brasileiros na capital inglesa. Jean Charles é um ícone e, por isso, fomos além dos fatos. O filme é uma obra de ficção inspirada em fatos reais. E também se fosse só sobre o Jean, teria que terminar na morte dele e todos já saberiam qual seria o fim da história. Mas, falando da prima dele, Vivian, pudemos ir mais longe. O Jean morre, mas a vida e a morte dele fizeram com que uma menina insegura virasse uma mulher independente. 10 – Por que vocês resolveram lançar o filme em um estádio de futebol na cidade-natal de Jean Charles, Gonzaga, em Minas Gerais? Fiquei muito emocionado com essa oportunidade, pois mostramos o filme às pessoas que conviveram com o Jean Charles. Tomara que tenha agradado. Afinal, nossa ideia sempre foi a de fazer um cinema popular. |
domingo, 28 de junho de 2009
ENTREVISTAS: HENRIQUE GOLDMAN - Racismo contra imigrantes
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