domingo, 14 de junho de 2009

ENTREVISTAS: Maria Cristina Megid - Cigarro apagado




Por Gisele Brito
gisele.brito@folhauniversal.com.br


A médica Maria Cristina Megid, de 52 anos, do Centro de Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo, irá comandar cerca de 500 fiscais que, a partir do dia 7 de agosto, irão colocar em prática o cumprimento da lei antifumo, em todo estado de São Paulo. A lei aprovada no início do mês impede que pessoas fumem em locais coletivos, públicos e privados e acaba com os fumódromos e áreas de fumantes. Similar a de outros países, o descumprimento da lei gera multas pesadas e até o fechamento por 30 dias dos estabelecimentos. Os fumantes, apesar de não serem penalizados pela infração, consideram a lei muito severa e a veem como uma lei “caça-fumantes”, que
restringe o direito de fumar.


1 – Por que é importante criar restrições ao cigarro em ambi-
entes coletivos?
Os males do cigarro estão comprovados, com mais de 70 mil trabalhos científicos. Em um ambiente fechado, onde a concentração das drogas contidas no cigarro é muito alta, as pessoas fumam sem fumar. Isso acarreta mil problemas de saúde. São 30% mais chances de desenvolver câncer, 20% mais chances de ter problemas como infarto e derrame, isso sem nunca ter fumado. Por isso, a proteção da população.

2 – Esses números se agravam para funcionários de lugares que
permitem o fumo?
O funcionário do estabelecimento está muito mais exposto que o cliente, porque o cliente vai algumas vezes, enquanto o funcionário está lá todos os dias, o que, em longo prazo, vai lhe dar problemas de saúde. A gente sabe que a expectativa de vida de pessoas que trabalham assim diminui, dependendo do tempo de exposição ao fumo. Mas qualquer exposição tem risco.

3 – Como será feita a fiscalização?
E quais as penalidades?
A fiscalização será feita pelos agentes de vigilância sanitária, do estado e dos municípios e também pelo Procon. Serão cerca de 500 funcionários. No primeiro descumprimento da lei, a multa é de R$ 792,50. No segundo, a multa dobra. Numa terceira fiscalização onde for comprovado o descumprimento, o estabelecimento é fechado por 48 horas. Em uma quarta – que esperamos que não aconteça – a interdição é de 30 dias.

4 – As pessoas também poderão enviar fotos para um site para denunciar o descumprimento da lei?
É verdade. Todo cidadão poderá fazer uma denúncia, por meio de um telefone e um site que estará no ar em alguns dias. O cidadão preenche uma ficha de denúncia – que não é anônima, mas é sigilosa – e encaminha. Se ela estiver devidamente identificada, assinada de próprio punho, a denúncia vai ser considerada.

5 – Lugares registrados como tabacarias vão poder funcionar
normalmente?
Sim, desde que não haja trabalhador no local em que se fuma e que o estabelecimento não venda mais nada. Os espaços não podem ser café e tabacaria, bar e tabacaria. Além disso, ele vai precisar ter uma exaustão de ar de acordo, a gente sabe que não existe exaustão plena, mas o máximo que é exigido ele vai ter que ter.

6 – Pessoas contrárias à lei argumentam que se criará um clima de criminalização ao fumante. O que a senhora acha disso?
Nós não entendemos dessa forma. Porque nós não somos contra o fumante. O fumante tem plena liberdade de fumar, desde que não afete o direito do outro de não estar em um ambiente poluído. Isso já ocorre em várias cidades de outros países; Buenos Aires, Nova York, Paris, em cidades da Irlanda, que foi o primeiro país, e no Uruguai. Nesses lugares, a lei já existe há muito tempo e não há problema, as
pessoas respeitam.

7 – E nesses países os números
demonstram o quê?
Indicam espantosos resultados após 1 ano de vigência da lei. Em alguns lugares, os casos de enfarte e derrames diminuíram 15% em fumantes e não-fumantes.

8 – As multas serão aplicadas aos donos dos estabelecimentos. Não seria mais efetivo se fossem aplicadas aos fumantes que descumprirem a lei?
Não, eu não acredito nisso. O fumante é um dependente. Ele precisa de ajuda, de tratamento, desde que ele queira, é lógico. O responsável será o empresário que for omisso e deixar que fumem dentro do ambiente.

9 – Críticos à lei argumentam que seria melhor, para a saúde, o combate à poluição do ar em geral, provocada pelos carros, por exemplo. São comparáveis esses dois problemas?
Nós fizemos junto com uma universidade essa comparação. A poluição do ar no município de São Paulo fica muito abaixo do que a poluição do ambiente de fumantes. A diferença é muito significativa. A poluição em ambientes que permitem cigarro chega a ser cinco, seis vezes maior do que em uma avenida de tráfego intenso. Por isso, temos que incentivar ambientes livres de tabaco.

10 – Nos últimos anos já houve uma mudança de cultura, em relação ao cigarro, que antes era glamorizado. Essa lei é um sinal de que é preciso endurecer ainda mais?
Na década de 80, nós tínhamos um percentual de 35% das pessoas fumando, era realmente muito alto. Agora, no estado de São Paulo, nós já estamos em 21%. Nos já tivemos algumas leis proibindo a propaganda do cigarro, o que ajudou muito. A intenção dessa lei é ser mais forte mesmo. Porque, hoje, nós sabemos que não adianta ter ambiente de fumante e não-fumante. Eu acho que é um grande passo. Nós estamos em harmonia com países mais desenvolvidos. Nós esperamos que sirva de exemplo para o resto do País. Mesmo porque, isso faz parte de uma convenção internacional, que é a Ambientes Livres de Tabaco, recomendada pela Organização Mundial de Saúde, da qual o Brasil faz parte. O município do Rio de Janeiro já tem uma lei igual, mas existe uma liminar e por isso associados ao
SindRio não estão cumprindo a legislação. O Estado do Espírito Santo tem uma lei parecida com a nossa. Já foi aprovada na Assembleia, só falta a sanção do governador. E nos municípios de Recife e João Pessoa também existem leis antitabaco.

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