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| Por Fernando Gazzaneo fernando.gazzaneo@folhauniversal.com.br Ela trocou o calor das praias do Rio de Janeiro pelo frio das montanhas do Chile, país onde vive e treina. Aos 32 anos, Isabel Clark é um dos principais nomes do snowboard brasileiro, esporte em que se desliza na neve numa prancha em manobras radicais. Ao contrário do que se imagina, e confirmando a origem carioca, Isabel não gosta de frio. Como ela mesma define, as baixas temperaturas estão entre as desvantagens a serem enfrentadas por amor ao esporte – a principal é a saudade da família. Tamanho esforço, porém, não é em vão. Nos Jogos de Inverno de 2006, em Turim (Itália), Isabel ficou entre as dez melhores do mundo na modalidade boardercross, variação do snowboard, atingindo o melhor resultado de uma atleta brasileira nos jogos de inverno em toda a história. De passagem pelo Brasil, ela se prepara para as últimas competições para uma vaga nos Jogos Olímpicos de Inverno de Vancouver (Canadá), que vão ser exibidos pela “Rede Record” em janeiro de 2010. A atleta falou à Folha Universal sobre os planos de criar um local para treinamento de esportes de neve no País.
1 – Como surgiu o interesse por praticar esportes na neve? Foi em uma viagem aos Estados Unidos, em 1996. Na época, meu irmão trabalhava em uma estação de esqui na Califórnia. Um ano antes, minha irmã tinha ido visitá-lo e trouxe fotos de lá. Fiquei bem impressionada. Com a ajuda do meu irmão, comecei com o esqui, que era mais fácil de aprender, mas o snowboard me parecia mais interessante. Na verdade, o esporte sempre esteve presente na nossa família. Já pratiquei hipismo e, no colégio, gostava de jogar vôlei, handebol e atletismo. O gelo foi a novidade.
2 – Quando você começou a praticar profissionalmente? Não consigo precisar uma data. As coisas foram acontecendo. Mas um ano muito marcante foi o de 2000, quando ganhei patrocínio para treinar com uma equipe francesa. Outro momento que marcou muito foi em 2003, quando a modalidade que eu gosto de praticar, o boardercross, passou a ser uma modalidade olímpica. Então, a Confederação Brasileira de Desportos na Neve (CBDN) disse que teria condições de me ajudar, disponibilizando profissionais para me apoiar. Eles (da CBDN) viram que eu tinha possibilidades de representar o Brasil com este esporte.
3 – Quais são as principais dificuldades de estar longe do Brasil? Não vi a mudança de temperatura como uma dificuldade, mas também não posso dizer que gosto do frio. Ficar longe da família dá muita saudade. Tenho dois sobrinhos e tento passar mais tempo com eles. São as desvantagens de passar a maior parte do ano fora. Tento superá-las pelo prazer de praticar snowboard.
4 – E como é ser casada com seu técnico, Ivan Fuenzalida? Com o tempo, você vai aprendendo a dividir aquilo que deve ser vivido no treino e dentro de casa. É um desafio conciliar esses dois relacionamentos. Ao mesmo tempo, eu vejo como uma vantagem porque o Ivan é parte da minha família e está sempre do meu lado. 5 – É possível treinar para esportes de neve no Brasil? Aqui, eu faço a parte de preparação física. Nesse primeiro mês e meio que pretendo ficar no País, vou treinar de segunda à sexta-feira, durante 3 horas por dia. Esta etapa é super importante porque aperfeiçoo minha disposição física para quando eu tiver que fazer os treinos e as competições na neve. A preparação aeróbica e os exercícios de força e rapidez de braços e pernas dão vantagens na hora de competir. Como lazer, faço alguns esportes com prancha para manter o equilíbrio.
6 – Você tem planos de criar um local de treinamento de esportes de neve e gelo dentro do Brasil? Na verdade, eu me formei em arquitetura, em 2007, e o meu projeto final foi uma pista indoor de neve, isolada do meio externo a uma temperatura de 5ºC negativos. O principal da estrutura é fabricar o gelo, o que não é tão complicado. Há lugares com temperatura semelhante a do Brasil, como Dubai, nos Emirados Árabes, que possuem uma estrutura como essa. É um sonho que eu gostaria muito de concretizar, mas o tempo é um obstáculo. Além disso, é um projeto muito grande e caro. Seria necessária uma parceira com patrocinadores.
7 – Mas a falta de lugares para treinar aqui no Brasil é a principal dificuldade? Faltam investimentos e patrocínios nesta modalidade? A questão do patrocínio é difícil no Brasil. Como não temos neve em nossas estações do ano, não há um mercado para se investir aqui. O bom é que eu tenho um patrocínio desde o início da minha carreira.
8 – Você fechou a última temporada dos Jogos de Inverno no 13º lugar no ranking geral da Copa do Mundo de Snowboard Cross, seu melhor resultado em pouco mais de 15 anos competindo. Como avalia esse momento da sua carreira? Este é o resultado de um trabalho que tem sido realizado desde 2003 e que está melhorando gradualmente. A partir desta data, comecei a trabalhar com treinador, preparador físico, nutrólogo e psicólogo esportivo. Até meados de 2005, além do snowboard, eu também competia em outra modalidade de esporte na neve. Vendo de fora, consigo perceber que ter focado meus esforços no snowboard contribuiu para este resultado.
9 – O desempenho da equipe brasileira de esportes na neve ainda é modesto frente a outras equipes? Vejo uma evolução dos atletas brasileiros. Eles estão se superando. A Jaqueline Mourão teve vários resultados expressivos nas provas de cross-country do esqui. Também no esqui, Jhonathan Longhi está tendo os melhores resultados de todos os brasileiros na história desta modalidade. Acredito que este desempenho dos atletas está relacionado ao papel da CBDN.
10 – Em janeiro de 2010, a “Rede Record” vai exibir os Jogos Olímpicos de Inverno. O que você acha que essa transmissão em tevê aberta pode trazer de positivo para os esportes no gelo? A partir dos jogos de Turim, o esporte no gelo começou a ter mais visibilidade. O Brasil está muito evoluído em comparação ao Chile e à Argentina, países que têm neve em casa, mas não têm cobertura televisiva como a que a “Record” promete fazer em 2010. Uma cobertura como essa, traz mais visibilidade e, consequentemente, pode trazer mais interesse de marketing. E isso não diz respeito só a mim, mas para os esportes de neve em geral. | | |